terça-feira, 25 de novembro de 2014

O que preferia não ter lido

Acontece esbarrar-me em livros que o ímpeto exige a compra imediata.
Nem que seja para dizer que é meu, que fica na estante à minha disposição para quando eu o quiser ler ou simplesmente ver-lhe a capa ou folheá-lo.
Há livros na minha estante que não sei se serão lidos.
Há livros na minha estante que não sei quando serão lidos.
Há livros na minha estante que demoram anos a ser lidos.
Há livros na minha estante que são lidos de imediato.
Há livros que são lidos com anos de atraso.
Mas todos são lidos na hora certa.


Acontece-me encontrar nos livros o que nem sabia que procurava.
Acontece-me encontrar nos livros o que pensava ser problema só meu e ficar aliviada com a desgraça também alheia.
Acontece-me encontrar respostas nos livros.
Acontece-me a coincidência de sentir naquela altura da minha vida o mesmo que os personagens sentem na história de papel.
Acontece-me o prazer de simplesmente ler.
Acontece-me ler o que preferia não ter lido, não porque seja desprovido de beleza ou desinteressante, mas porque pedaços de literatura não nos permitem ficar pelo simples prazer do acto de ler.
Porque ferem. Porque fazem pensar. Porque ferem. Porque nos emocionam quando não queremos. Porque ferem. Porque nos descobrem. Porque nos ferem. Porque não nos deixam mesmo depois de os termos lido há horas.


***


“As mulheres interessam-se mais por quem estão apaixonadas, e apaixonam-se mais por quem se interessam…
Isto para chegar a duas frases d’A Mulher de Trinta Anos que foram uma revelação, quando as li.
A primeira diz: “A paixão faz um progresso enorme numa mulher no momento em que ela crê ter agido pouco generosamente, ou ter ferido uma alma nobre”.
E a segunda conclui: “Nunca se deve desconfiar dos maus sentimentos no amor, eles são muito salutares; as mulheres não sucumbem senão ao golpe de uma virtude.”
Gelei. Porque algures em 1830, entre duas taças de café negro, um parisiense-tão-parisiense escrevera o que aconteceu comigo em Maio de 2014 no Alentejo.”


In "O meu amante de domingo", de Alexandra Lucas Coelho


***
Afinal minto (a mim própria).
Nunca me arrependerei de ler o que me fere, o que me ensina, o que me emociona, o que me ajuda, o que me provoca, o que me dá prazer, o que me leva a escrever, o que me leva a viver.
Só que...

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