sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Saltos sem chão

A natureza fez-me reservada, tímida e ... discreta. O que a maior parte das vezes é uma chatice.
O esforço em provar o que quer que seja é sempre redobrado, os receios são múltiplos, o deixar-me conhecer torna-se demorado, o que também me priva de conhecer mais fácil e naturalmente outras pessoas. É só perdas.
Não foi surpresa para mim quando a minha família se espantou pelo meu interesse no teatro, primeiro, na dança, depois.
Antes não me surpreendeu o meu gosto pela arte de representar e de dançar. Era um mundo de sonhos. O que me surpreendeu foi a força em tentar tornar esse mundo um pouco mais real.
O teatro ocupou-me pouco tempo, mas foram meses mágicos de provas dadas e medos ultrapassados. O pouco tempo dedicado idealizou este amor. Hoje satisfaço o meu bichinho vendo teatro, respirando os teatros que visito, suspirando nos teatros onde me sento.
Mudança de vida encaminhou-me para outro amor, a dança. Este mais longo, como tal mais vivido e  sofrido. Não é fácil uma tímida expor-se em palco. A vontade de bem expressar algo colide com a discrição da personalidade e o receio, sempre lá, de falhar.
Deste caminho dançado já longo valorizo a satisfação libertadora dos movimentos, a pessoa mais fluída em que me tornei, as amizades criadas, as aventuras em palco e fora dele.
Todos os anos eu piso os palcos, o nervoso miudinho da responsabilidade acompanha-me sempre, mas tudo é vivido de uma forma leve, descomprometida.
Por estes dias vivo a experiência intensa da preparação de um espectáculo. E desta vez não é leve nem descomprometido. É a vontade férrea de proporcionar um bom momento de evasão.
É a vontade férrea de desempoeirar, de libertar medos entretanto sedimentados.
E é a vontade férrea de pisar um palco e dar largas à emoção. De dar um salto sem chão à vista.

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